Inteligência emocional na era da Inteligência Artificial
A inteligência artificial veio alterar profundamente o mercado de trabalho. Tal como a mecanização ocorrida durante a revolução industrial tornou a força física dos humanos menos necessária, também a revolução introduzida pelas tecnologias da informação irá colocar a nossa inteligência cognitiva e competências mais técnicas a rivalizar com as das máquinas.
À medida que a IA e o Machine Learning se vão desenvolvendo, um leque vasto de profissões intimamente relacionadas com a nossa capacidade de pensar serão afetadas. Profissões em áreas que, até há bem pouco tempo, não imaginaríamos sequer serem possíveis sem a intervenção humana, como é o caso da medicina, ensino, marketing ou consultoria financeira. É neste contexto que competências exclusivamente humanas, que decorrem da inteligência emocional, como a persuasão ou a empatia, se vão tornar diferenciadoras.
O que a IA faz melhor do que nós
O melhor é habituarmo-nos à ideia de que, mais cedo ou mais tarde, a IA vai ultrapassar a capacidade humana em vários aspetos. Segundo o futurista Ray Kurzweil, que é também diretor de engenharia da Google e reconhecido por ter olho para previsões acertadas, em 2029 as máquinas deverão atingir o nível da inteligência humana. E dentro de trinta anos vão mesmo tornar-se mais inteligentes do que nós, atingindo a singularidade, defende.
Embora o horizonte traçado por Kurzweil possa parecer longínquo (ou irrealista para algumas pessoas), a verdade é que há já um conjunto de coisas que as máquinas conseguem fazer melhor do que os seres humanos—por muito que isso nos custe a admitir.
O facto é que nenhum de nós se atreveria a competir com um computador quando o trabalho em mãos é a recolha e análise de dados, até porque nenhum humano é capaz da mesma capacidade de processamento. O mesmo em relação à rapidez e precisão com que as máquinas realizam determinadas tarefas, quando comparadas com trabalhadores de carne e osso.
Além disso, as máquinas não se sentem cansadas, não precisam de fazer pausas para comer, nem se deixam afetar em situações de stress, como acontece com os humanos. Há também quem argumente que não têm preconceitos ou enviesamentos —embora no caso da inteligência artificial isso já tenha sido contestado por vários cientistas, afinal os algoritmos são também eles programados por humanos.
O que tudo isto significa para muitas profissões, mesmo para as que exigem capacidades técnicas e cognitivas elevadas, é que o valor dos profissionais que as desempenham se está a rapidamente a erodir.
Inteligência emocional: aquilo em que a IA não nos pode bater
O conceito foi introduzido nos anos 90, por iniciativa dos psicólogos John Mayer e Peter Salovey, mas quem o popularizou foi Daniel Goleman, o psicólogo e jornalista que escreveu o best-seller ‘Inteligência Emocional’.
De acordo com estes autores, a inteligência emocional refere-se à capacidade de reconhecer e identificar as nossas emoções e as dos outros, de saber geri-las, e de usar essa informação para guiar a nossa forma de pensar e de nos relacionarmos com os demais.
Num mundo em que as máquinas vão assumir cada vez mais funções, é precisamente a inteligência emocional que nos pode colocar em vantagem, defendem dois investigadores da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos.
"Aqueles que se queiram manter relevantes nas suas profissões terão de se focar nas competências e capacidades que a inteligência artificial tem dificuldade em replicar— a capacidade de compreender, motivar e interagir com outros seres humanos”, escreveram Megan Beck e Barry Libert na revista Harvard Business Review.
O mesmo é sublinhado pelos autores do relatório do Fórum Económico Mundial, "The Future of Jobs 2018”, que apontam a inteligência emocional como uma das dez competências que serão mais valorizadas pelos recrutadores até 2022.
O que este e outros estudos sugerem, é que os empregos do futuro vão exigir muito mais da nossas competências emocionais para complementar aquilo que nem as máquinas mais sofisticadas com que trabalhamos conseguem alcançar.
A inteligência artificial pode certamente diagnosticar doenças complexas e recomendar o tratamento melhor do que um médico, mas não é capaz de se sentar a conversar com o doente, de lhe explicar como o diagnóstico irá afetar a sua vida, e muito menos de demonstrar empatia pela sua situação.
A IA pode analisar vastos conjuntos de dados numa empresa, avaliar a situação financeira, detetar fragilidades, medir o cumprimento dos objetivos e determinar o melhor curso de ação. Mas ao contrário de um gestor, nada sabe sobre liderança e negociação ou sobre aquilo que é preciso para motivar e inspirar uma equipa.
Um chatbot pode substituir um humano no serviço de apoio ao cliente, fornecendo informações simples e rápidas através de respostas automáticas, embora não seja capaz de demonstrar qualquer compreensão pelas frustrações dos consumidores. E são os próprios que dizem preferir falar com uma pessoa, sobretudo quando as coisas correm mal, acusando as empresas de estarem a perder contacto com o elemento humano.
São estas capacidades, que decorrem da nossa inteligência emocional, que se vão tornar cada vez mais valorizadas nos próximos anos, afirmam os investigadores da Universidade da Pensilvânia. Competências como a persuasão, liderança, motivação, empatia, compreensão, entre outras.
"Infelizmente, estas competências genuinamente humanas têm sido relegadas para segundo plano em termos de formação e educação. Já todos tivemos a experiência com um médico ou consultor financeiro, que está mais concentrado nos seus dados e relatórios, do que na nossa situação específica ou desejos”, lamentam.
Ao contrário das máquinas, enquanto seres humanos estamos programados para sentir e expressar emoções e, em última instância, é isso que nos distingue delas. Num mundo cada vez mais dominado pela tecnologia, desenvolver as nossas competências emocionais e inspirarmos os outros a fazê-lo também, é a melhor forma de nos mantermos relevantes no mundo do trabalho. A boa notícia, é que a natureza já nos deu essa vantagem, basta sabermos aproveitá-la.